Minha cabeça anda inquieta e feliz pelo que nós da equipe temos perseguido. Tenho pensado muito na importância dessa constante reflexão que todos nós arte-educadores precisamos fazer já que é muito tênue a linha que separa o estabelecido e a arte (o ordinário e o extraordinário).
Precisamos mesmo ficar atentos para as diferenças entre, por exemplo, o conforto e a inquietação ou mesmo um padrão de certezas e a ousadia viva que, generosamente, nos oferecem as dúvidas.
Nosso trabalho é assim mesmo, entendemos uma parte e a outra nos aguça para continuarmos tentando.
No caso das crianças que atendemos no projeto, suas histórias são repletas de incompreensões, violências, injustiças, infelizmente potencializadas pela distância que elas vivem do imaginário, do sonho, do abstrato. Por isso, é comum assistirmos sensibilidades anestesiadas, tornando os primeiros contatos com a arte sempre difíceis, repletos de resistências.
Cada uma que ajudamos a romper essa barreira transforma-se no grande estímulo para buscarmos a multiplicação dessa conquista.
Há um ensaio do filósofo Paul Valéry sobre os mitos, que ele conclui assim:
“O que seríamos nós sem o recurso daquilo que não existe? Pouca coisa, e nossos espíritos, desocupados, tenderiam a fenecer se as fábulas, os enganos, as abstrações, as crenças e os monstros, as hipóteses e os pretensos problemas da metafísica não habitassem com seres e imagens sem objetos nossas profundezas e nossas trevas naturais”.